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Pistas Homilético-franciscanas

Liturgia da Palavra: Ex 32,7-11.13-14; Sl 50; 1Tm 1,12-17; Lc 15,1-32

Tema-mensagem: Misericordiosos como o Pai é misericordioso

Sentimento: gratidão jubilosa


Introdução

Mais do que em outros domingos, a celebração de hoje nos leva ao coração de toda a Boa Nova. Através de três belas e comovedoras parábolas – a ovelha, a moeda e o filho perdidos e reencontrados – Jesus, faz irromper no mundo de hoje a verdade mais profunda de seu Deus e nosso Deus, de seu Pai e nosso Pai: a misericórdia divina.


Misericórdia a mãe da ova humanidade (Lc 15,1-32)

O fato de elaborar três parábolas para revelar a misericórdia do Pai, revela o quanto importa para Jesus que esta mensagem chegue até o coração e o cotidiano de todos nós.


1.1. O ponto de partida

O ponto de partida e a razão que sustenta todas estas parábolas vem apresentado como um contraste alegre e triste, edificante e decepcionante ao mesmo tempo: se, de um lado, “os publicanos e pecadores aproximavam-se de Jesus para o escutar”, de outro lado, “os fariseus e mestres da lei criticavam Jesus:’Este homem acolhe pecadores e faz refeição com eles’”. Como e o que fazer, pois, se pergunta Jesus, para que sua tão “bela e importante notícia” pudesse penetrar em corações tão endurecidos? O recurso foram as parábolas.

A parábola (“parabolé”, em grego), é um modo de falar que atinge a pessoa de modo oblíquo, indireto, sem ofendê-la ou pressioná-la. Atinge à medida que evoca, acena, assinala para um mistério que se retrai, mas que, embora oculto, já está presente e atuando no âmago do próprio ser do homem. No nosso caso, o “Reino de Deus”, isto é, a vigência e a regência da misericórdia de Deus, que se revela na pessoa e na ação de Cristo, “O rosto da Misericórdia”.

No livro “O nome de Deus é misericórdia”, o entrevistador do Papa Francisco conta-lhe a seguinte estória. Um professor de ensino religioso, depois de haver contado aos seus alunos a parábola do filho pródigo, pediu-lhes que escrevessem um tema livre, abordando a história que haviam acabado de ouvir. “O final escolhido pela grande maioria dos alunos foi este: o pai recebe o filho pródigo, pune-o severamente e o manda viver com os seus servos. Assim aprenderá a não gastar todas as riquezas da família...”. E o Papa Francisco responde: “Essa é uma reação humana. É a reação do filho mais velho; é humana. No entanto, a misericórdia de Deus é divina” (p. 83).


1.2. A misteriosa figura do filho mais novo

A parábola começa narrando a desventura do filho mais novo que, um dia, procura o pai, solicitando-lhe a parte do patrimônio que lhe cabia por herança. É o desejo, o impulso da natureza para alcançar a maioridade, a autonomia – o viver por si e para si: o viver autocentrado, na sua “autoreferencialidade”, diria nosso papa. Não percebe, porém, que esta sua atitude se constitui não apenas no rompimento e separação com sua origem, mas, na morte, em seu coração, do próprio pai. O pai, porém, em vez de ciumento é generoso. Prefere negar-se a si mesmo a fim de deixar-ser o manancial que Dele emana: sua cria, sua criatura, o seu filho (o homem). Deus franqueia o caminho do homem, mesmo quando este caminho leva o homem para longe Dele.

Não é difícil perceber aqui que a desventura deste filho é a desventura de todos nós, filhos de Adão. Adão é todo homem e todo o homem é Adão. Adão é o homem que, seguindo o caminho da “própria vontade” quis apropriar-se (São Francisco, Ad 2), fazer-se dono do dom de sua semelhança com o Pai (herança paterna). O homem podia – na verdade, devia – ser semelhante a Deus. Mas o homem, ao invés de se tornar semelhante a Deus com Deus, prefere ser semelhante a Deus contra Deus transformando o dom em propriedade sua, a graça em merecimento e conquista.

Recebida a herança, o filho mais novo “partiu para um lugar distante onde esbanjou tudo numa vida desenfreada”. A separação de Deus não se dá pela distância de lugares, mas pelo distanciamento do afeto, do coração. Separar-se de Deus é romper a familiaridade com a origem, com a vida fontal, o Pai. Mas, assim como o manancial não pode subsistir se romper seu vínculo com a fonte, assim também as forças da autonomia e da existência egocentrada do homem, logo se dispersam e se perdem.

A tradição cristã costuma chamar este jovem de “filho pródigo”. Pródigo é o homem que vive numa vida pródiga, isto é, que vive na dissolução das suas forças, de seus dons vitais. Derramando seus afetos nas coisas exteriores, no “mundo”, rapidamente se encontra no vazio interior de si mesmo, no vazio da sua autoconsciência dilacerada, tornando-se logo um miserável, um perdido, escravo de si mesmo e dos outros.

Mergulhado nesta degradação não lhe resta outra alternativa senão tornar-se “pastor de porcos”, tido, na época, como um dos ofícios ínfimos e infames. Para um judeu, então, era o cúmulo da indignidade, da baixeza, pois os porcos eram considerados animais impuros. Para os Padres da Igreja “apascentar porcos” equivale à agitação do homem que se entrega ao desregramento e sofreguidão dos desejos sensuais, das paixões dissolutas, dos pensamentos sórdidos, dos vícios mais baixos. Nesta penúria, o homem tem fome. Mas, o alimento que lhe é próprio, isto é, apropriado à sua dignidade – o amor, a proximidade do Pai – e que poderia saciar-lhe a fome, ele o havia dispersado. O que lhe resta, agora, é a comida de porcos: contentar-se com o inumano, o desumano e o subhumano de seu humano. Por isso tem de encher a barriga com “alfarrobas”, um alimento que, à semelhança do vento, enche, mas não nutre, segundo Ambrósio. Agostinho, por sua vez, compara este alimento com doutrinas que não satisfazem a fome de verdade que habita o coração do homem.

Mas, “pródigo”, a exemplo de São Francisco quando jovem, tem, também, o sentido de “dissipador” ou esbanjador, que não mede nos gastos. Neste sentido, a prodigalidade é um modo errôneo de imitar a generosidade, a magnanimidade, a leveza do receber e do dar. A prodigalidade do filho torna-se, assim, uma última ressonância da generosidade do pai, uma imitação malsucedida da sua magnanimidade. Por isso, acabrunhado pelos trabalhos e pela penúria, “caiu em si”, ou seja, foi tocado pela graça da sua origem, da casa paterna: começa a ver de novo o rosto misericordioso do Pai. Os diaristas de seu pai são mais bem tratados, têm pão de sobra, enquanto ele morre de fome, comendo comida de porcos, alfarrobas. Começa, então a abrir mão do seu orgulho ferido. Arrependendo-se do seu mau caminho, que só lhe trouxe desventura, exclama: “vou ter com o meu pai”. Estava deitado, agora precisa se levantar, distante precisa voltar e aproximar-se da origem, escravo, agora precisa se libertar. A confissão da própria culpa é o primeiro ato desta libertação. Confessar a verdade da própria miséria, assim como louvar a verdade da misericórdia de Deus, significa entrar no vigor da humildade (Cf. mais adiante no item 7).

Mas e finalmente, este filho, poderia ainda significar o próprio Cristo, o filho mais novo da humanidade, o novo Adão. Enviado pelo Pai, Ele que nunca cometeu pecado nenhum, na pura inocência e boa vontade, a fim de resgatar o homem de sua desventura, assumiu e carregou todas as conseqüências do desmando da humanidade. Este demando tornou a terra de jardim de delícias (paraíso) em vale de lágrimas. Mas, como diz o salmista, “a terra está cheia da misericórdia de nosso Senhor” (Sl 32, 5). Cristo veio, justamente, manifestar a plenitude desta misericórdia, assumindo sobre si nossas enfermidades. Por suas chagas Ele nos curou, nos trouxe a saúde e a salvação. A terra já não é só o lugar dos tormentos e das misérias dos homens, é também, e sobretudo, o lugar da misericórdia de Deus.


1.3. Um Pai cujo nome é Misericórdia

Depois de descrever a desventura do filho mais novo a parábola passa a falar do pai acentuando que, quando o filho “ainda estava longe, seu pai o avistou e sentiu compaixão. Correu-lhe ao encontro, abraçou-o e cobriu-o de beijos”. A parábola repete uma das constantes de toda a Sagrada Escritura: Deus vem ao encontro do homem pecador, de coração contrito e humilde. E não poderia ser diferente. Pois, como poderia um Pai não correr ao encontro de um filho desventurado que humildemente retorna para sua casa!? Como não abraçar e não beijar com amor visceral, com afeto irresistível, sua própria cria, sua criança, seu filho? Por isso, diz o Papa Francisco: “Misericórdia é a atitude divina que abraça, é o doar-se de Deus que acolhe, que se dedica a perdoar” (p. 37). Deus não pode negar-se a si mesmo (cfr. 2 Tm 2, 13). Não pode não nos amar, pois não nos amar seria ir contra sua própria essência, sua necessidade mais visceral, uma vez que Deus é amor. “Você pode renegar a Deus, você pode pecar contra Ele, mas Deus não poderá renegar-se a si próprio, Ele permanece fiel”, diz o mesmo Papa (p. 38).

A misericórdia, o abraço e os beijos do Pai testemunham assim, a mesma loucura e fraqueza de Cristo na Cruz, o “Rosto da Misericórdia”. Uma fraqueza que cria e recria. Ao perdoar o filho, o pai o cria de novo devolvendo-lhe a semelhança divina que havia usurpado e esbanjado, restituindo-lhe a dignidade de filho querido e não de empregado ou servo.

Há uma constante no Evangelho. Aqueles que se consideram a si mesmos “justos”, “homens de bem”, os (falsos) moralistas – chamados por Jesus de “hipócritas” – isto é, todos nós, têm e temos, uma dificuldade enorme de aceitar que os “pecadores”, os “corruptos”, os “perdidos” possam se converter; todos, nós e eles temos um zelo, que no fundo oculta uma inveja para com a bondade de Deus, julgando que “misericórdia demais” para com esta gente equivale à injustiça, à condescendência com o pecado. Assim, o aparente zelo pela lei e pela moral, esconde a incapacidade de compreender a jovialidade e a gratuidade do amor de Deus, a Boa Nova da sua misericórdia. Daí a decisão do Papa de proclamar 2016 como ano do “Jubileu extraordinário da Misericórdia” a fim de que aprendamos a ser “misericordiosos como nosso Pai é misericordioso”.


1.4. A festa e o bezerro gordo sacrificado

Com a volta do filho, o pai manda, primeiramente, que os servos tragam a “primeira roupa”, um anel para o dedo, as sandálias para os pés. Ele é revestido de novo com a dignidade, a beleza e integridade, que tinha perdido. O anel assinala a autoridade e as sandálias, a liberdade (os escravos não andavam de sandálias). O filho não é aceito na condição de servo, nem de diarista, mas de senhor, de homem livre. Ele é recebido na condição de igualdade com o pai. A igualdade com Deus que o homem almejava contra Deus, por meio do pecado, que levara a se arruinar, agora é dada na graça. Trata-se, pois, de ser igual a Deus, não contra Deus, mas com Deus. Os Padres da Igreja lembram que o homem pode se relacionar com Deus de três modos. Como servo – a partir do temor do castigo. Como mercenário – a partir do interesse pelo prêmio, pelo salário (é a situação de diarista). E como filho – a partir da gratuidade e do afeto do amor.

Terminada a cena da nova investidura, o pai manda os servos matarem o bezerro gordo para servir no festim que iria celebrar o reencontro com o filho, seu resgate, sua saúde e salvação. Os Padres da Igreja veem na imolação do bezerro gordo o sinal do sacrifício de Cristo. Ambrósio lembra que o bezerro era vítima sacrifical. Agostinho recorda, ainda, que, na Igreja, o retorno do filho à casa paterna acontece com a confissão e a penitência e o festim que celebra a reconciliação acontece com a eucaristia.


1.5. O filho mais velho

Quando a história parece ter chegado ao seu clímax entra em cena o filho mais velho – representante dos fariseus de ontem e de sempre - que voltava do campo. É trabalhador. Está a serviço da obra divina. Mas, não como filho, que trabalha por amor e sim por temor como servo, por prêmio como diarista. Chegando perto de casa, ouviu música (symphonía) e dança que significam a alegria dos que cantam e dançam o canto e a melodia da eterna misericórdia do Pai: as novas criaturas – os filhos de Deus que estavam mortos pelo pecado e que ressuscitaram pela graça. Se o pai mostrara compaixão, o filho mais velho mostra ira. O fariseu brada pela justiça divina. Ele é o guardião da ira de Deus... Não consegue entender que esta ira não tenha se descarregado sobre o filho mais novo, um dissoluto; não aceita que o pai tenha relaxado a sua justiça, expressando bondade para com um usurpador e dissipador de seus bens. À ira junta a inveja: inveja do irmão que é beneficiado com a bênção do pai. À ira e à inveja se juntam o ressentimento. Enquanto o filho mais novo era o preferido, o pupilo do pai, ele era tratado apenas como um empregado. Sua fidelidade nunca tinha sido reconhecida: o pai nunca tinha lhe dado sequer um cabrito, o gado mais insignificante da fazenda, para que ele pudesse festejar com os amigos. Assim, cego pelo seu egocentrismo e pela vindicação e reivindicação da justiça omitida, é tomado pelo espírito de vingança, não conseguindo ver, jamais, que tudo o que o pai tinha era dele também.

Assim enquanto o filho insiste na justiça dos homens, do mundo, que ele sempre observou, o pai, com seu olhar jovial e sereno, aponta para a misericórdia, o sumo da justiça, uma justiça que supera, preenche e satisfaz verdadeiramente todas as medidas, todas as justiças; a justiça de um pai “universal” que faz chover sobre justos e injustos, cair o sol sobre bons e maus; um pai que quer que também ele, o filho mais velho, isto é, o Povo da antiga aliança, ascenda à liberdade, à jovialidade, à ternura e fraqueza da misericórdia, que é uma perfeição muito maior do que a frieza da justiça, motivada pelo espírito de vindicação. Jerônimo observa que o filho mais velho representa o religioso, o homem que se encontra junto de Deus por força e obrigação da lei, e não pelo afeto, pelo amor. Podemos dizer que, no fundo, ele não se compreende como o filho que ele é, mas como escravo e como mercenário. Ambrósio, por sua vez, diz que a atitude do filho mais velho antecipa a sua velhice, tornando-o cada vez mais ressentido, reivindicativo, ranzinza, teimoso e birrento. O espírito justiceiro priva-o, ainda, da jovialidade do Pai excluindo-o da sua música e da sua dança.

A parábola acerca da misericórdia do Pai nos alerta para o perigo da nossa justiça. Romano Guardini, no seu livro “O Senhor”, recorda que há algo de mais alto do que a justiça: o “abrir-se do coração na bondade”. A justiça é clara para as coisas humanas e deste mundo, mas, sem a bondade, corre o risco de se tornar cega e fria para as coisas de Deus e do amor. A justiça coloca todos dentro de suas medidas, aprisiona, a bondade, porém, é cordial, aquece e liberta. A justiça ordena, mas a bondade produz, cria. A justiça torna suficiente o que é. A bondade, cria o novo. Na justiça se expressa o espírito de satisfação com a ordem cumprida, mas da bondade salta a alegria da vida criativa e criadora. Por isso, dizia Jesus que no céu, isto é, em Deus e nos seus mensageiros, anjos e santos, há mais alegria por um pecador que faz penitência do que por noventa e nove justos que dela não precisam. “Se Deus se detivesse na justiça, deixaria de ser Deus” (MV 21)


2. A misericórdia vem ao nosso encontro [1Tm 1,12-17]

Entre as inúmeras pessoas que puderam provar de perto a misericórdia de Deus está São Paulo. Na segunda leitura de hoje, fala de ter sido agraciado, perdoado, por Deus. Dominado e cego por um falso “amor” da lei Ele agia de modo hostil aos discípulos de Cristo – o que quer dizer, contra o próprio Cristo. Tendo sido iluminado pelo Cristo, que lhe veio ao encontro no caminho de Damasco, derrubando-o da cegueira da justiça da lei, foi transformado num novo homem. Daí suas palavras: “A graça de Nosso Senhor superabundou em mim, com a fé e a caridade que temos em Cristo Jesus” (14). Tudo isto lhe aconteceu, porém, porque, agindo com a ignorância de quem não tem fé, foi visitado pela “misericórdia” (13). O milagre da conversão de Paulo, prova mais uma vez o que Jesus havia dito: que ele viera para os doentes e pecadores e não para os sadios e justos. Por isso, Paulo diz: “Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores e eu sou o primeiro deles. Mas alcancei misericórdia, para que, em mim primeiramente, Jesus Cristo manifestasse toda a sua magnanimidade, como exemplo para os que hão-de acreditar n’Ele, para a vida eterna” (15-16).

Ao declarar-se o primeiro dos pecadores, Paulo expressa sua humildade. Nos “Atos do Bem-aventurado Francisco e dos Seus Companheiros” (c. 10) lemos o jocoso “fioretti” de como frei Masseo procurou saber porque todo o mundo vinha atrás de Francisco. A resposta de Francisco veio depois de um momento de enlevo e brotou da sua alegria e da sua gratidão pela misericórdia de Deus para com ele: “Queres saber donde a mim? Queres saber e saber bem donde a mim, que todo o mundo anda atrás de mim? Isto vem daqueles Santíssimos olhos de Deus, que em toda a parte contemplam os bons e os maus. Pois, aqueles bem-aventurados e Santíssimos olhos, não viram, entre os maus, um pecador mais vil e mais insensato do que eu. E, por isso, para realizar esta obra maravilhosa que pretende fazer, não viu na Terra uma criatura mais vil. E assim me elegeu: porque Deus escolheu as coisas estultas do mundo para confundir os sábios, Deus escolheu as coisas ignóbeis e desprezíveis e frágeis do mundo para confundir os nobres e os magnatas e os fortes; para que a sublimidade da virtude venha de Deus e não da criatura, para que toda a carne não se glorie no seu conspecto; mas, quem se glorie, glorie-se no Senhor, para que só a Deus seja a honra e a glória para sempre”.


3. Moisés o grande intercessor [Ex 32,7-11.13-14]

Certamente, uma das figuras mais expressivas do Antigo Testamento que revelam a vocação e a missão do futuro Messias é Moises. É o que proclama o livro do Êxodo, na primeira leitura de hoje. A corrupção, a quebra da Aliança com Jahvé, as infidelidades, enfim do Povo de Deus haviam chegado ao cume de haverem trocado a Ele, o seu Deus vivo e verdadeiro, por um bezerro de metal fundido, diante do qual se inclinavam em adoração. Chegaram ao cúmulo da desfaçatez de oferecer-lhe sacrifícios dizendo: Estes são os teus deuses, Israel, que te fizeram sair do Egito.

Vem, então a constatação e a decisão do Senhor: Vejo que este é um povo de cabeça dura. Deixa que minha cólera se inflame contra eles e que eu os extermine.

Entra em cena, então Moisés com sua intercessão. Ele não aceita o discurso do Senhor. Muito menos sua decisão. Por maior que seja o pecado de Israel Deus não podia esquecer que fora Ele que o havia procurado e tirado da escravidão do Egito; que este Povo, por maiores que sejam sua infidelidades é seu Povo, assim conhecido perante os demais povos. Se, de fato viesse a executar sua decisão não iriam os egípcios ridicuralizá-Lo dizendo que o tirara do Egito com a malévola intenção de exterminá-lo no deserto? Finalmente, onde ficaria a palavra então dada outrora aos patriarcas Abrão, Isaac e Israel? Em outras palavras, onde estria a glória de Deus se Ele não se mostrasse compassivo e fiel em sua palavra e ação?

A história do bezerro de ouro no deserto pode ser considerada como um novo pecado original. Se outrora Adão e Eva abandonaram o Criador para seguir a vontade própria, agora, Israel também abandona a Aliança com Jahvé para seguir o bezerro de sua soberba. Todavia, se ao primeiro pecado original Deus responde com a promessa de um descendente que haverá de esmagar a serpente da soberba humana [Gn 3,15] agora, por intercessão de Moisés, figura muito expressiva do futuro Messias, Deus não se conforma com a ruptura de sua Aliança por parte do Povo. Por isso, desistiu do mal que havia ameaçado fazer ao seu Povo [Ex 32-14].


Conclusão

“Diante de uma humanidade ferida, uma humanidade que possui muitas feridas” (Papa Francisco) ou começamos a reconstrução com o remédio da misericórdia ou continuaremos distanciados, divididos e perdidos sem jamais podermos celebrar o júbilo do retorno à nossa origem comum, sem o júbilo do reencontro conosco mesmos, com os outros e muito menos com o nosso Pai comum, “o Pai das Misericórdias” (Santa Clara).

“Sede misericordiosos como vosso Pai do Céu é misericordioso!” (Lc 6,36).

Fraternalmente,

Marcos Aurélio Fernandes e Frei Dorvalino Fassini

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