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Carta de Páscoa



Senhor, livraste minha vida da morada dos mortos;

poupaste-me para eu não baixar ao fosso.

Sal 30, 4



- Aos Frades da Ordem

- Às Irmãs Clarissas e Concepcionistas

- Às leigas e leigos franciscanos



Caros Irmãos e Irmãs, o Senhor vos dê a paz!


Na ressurreição de Piero della Francesca, o Cristo se ergue vitorio­so sobre a morte, mas, se olhamos com atenção, podemos captar, na expressão do rosto, um véu de dor. O Senhor Crucificado-Ressuscitado passou pela vida e pela morte até o fim, experimentou, descendo até à morada dos mortos, toda a realida­de da condição criatural, com as suas contradições.


Aqui, o meu pensamento reporta­-se a São Francisco. No início de sua conversão, retornando de um ban­quete com os amigos, ia um pouco atrás deles, se detém e

experimenta uma inesperada e desconhecida do­çura, fruto de uma visita interior do Espírito (cf. LTC 7).


Mais tarde, no encontro com o leproso, depois do primeiro instinto de fuga pela repugnância daquele corpo em decomposição, Francisco poderá finalmente abraçá-lo e beijá-lo, experimentando que «aquilo que me parecia amargo se me converteu em doçura de alma e de corpo » (Test 3).


Acaso não é essa fonte interior de doçura que lhe possibilita, então, celebrar a Páscoa com o leproso e, por sua vez, com tantos outros? O cheiro do limite e da morte o fez abrir-se à doçura da vida nova: é Páscoa!


O caminho é traçado por nós, o passo é irreversível.


Celebrar a Páscoa significa não desviar o olhar da realidade humana, com seus contraditórios aspectos luminosos e obscuros: o desejo de amar e de gerar vida plena em meio às guerras, ao sofrimento da casa comum, aos terremotos, às feridas causadas ao diálogo e à fraternidade entre pessoas, grupos, nações, famílias, até mesmo em nossa Igreja e também em nossa Fraternidade.


Como não reconhecer a Páscoa que irrompe desses “infernos”, dado que a graça do Ressuscitado faz novas todas as coisas e nos permite permanecer mesmo diante do escândalo do mal, que muitas vezes parece vencer?


No Centenário da Regra, aliança de vida, queremos acolher com um novo entu­siasmo o chamado a testemunhar com a vida e a palavra a esperança do Evangelho nos “infernos” e nas rachaduras de luz deste tempo, difícil de decifrar e sempre amado por Deus.


Em Greccio, Francisco escutou ainda o Evangelho, na medida em que quis ver com os outros os apuros e a pobreza em que nasceu o Filho de Deus, que perma­neceu conosco em migalhas de pão. O estilo do Evangelho é aquele dos pequenos e dos pobres, livres da tentação do poder e da posse, feitos capazes de construir com paciência e juntamente com outros oásis de fraternidade e de esperança, nos quais aprender a escutar e a caminhar com muitos. Eis um percurso pascal para nós hoje, a fim de que o Evangelho, vivido como irmãos e irmãs, preencha este tempo devastado por tanta violência e desejoso de paz verdadeira.


Tudo isso se torna possível na medida em que reconhecemos que estamos vi­vendo em uma época em que é preciso caminhar como “buscadores espirituais”, que acreditam no Crucificado-Ressuscitado e iluminados pelo fogo da Páscoa nos caminhos do mundo.


Minhas saudações pascais se tornam, então, uma alegre oferta de alguns passos de vida:


· O deserto quaresmal nos convocou a lutar corpo a corpo com a Palavra de Deus, conosco mesmos e a nossa fome, com a vida de tantos esquecidos: prossi­gamos neste caminho de luz!


· A Páscoa rompe e supera o desencanto dos desiludidos: deixemo-la re­bentar nossos medos como promessa e início da paz verdadeira, também no tempo da guerra e de tantos “terremotos”!


· Deixemos nossas muitas zonas de conforto e, finalmente, tenhamos a cora­gem de perder a estabilidade indo ao encontro do outro, dos outros, para apren­der a chorar e a sorrir nas ruas repletas de pessoas de todos os gêneros, reconhe­cendo nelas os traços do rosto do Vivente; ousemos nos tornar mais “Ordem em saída”!


· Deixemo-nos ser enviados mais longe pelos anjos da manhã de Páscoa, para procurar o Cristo Ressuscitado entre os vivos e não entre os mortos: vamos anunciá-lo a todos no louvor e no convite à conversão!


Com a bênção de São Francisco, desejo de todo o coração a todas e todos uma Páscoa de vida, na e através da realidade da humanidade de hoje, da qual parti­cipam muitos entre nós, em diversas partes do mundo.


Vosso irmão e servo

Fr. Massimo Fusarelli, ofm

Ministro geral

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